"MALTÊS"
Em Cerromaior nasci.
Depois, quando as forças deram para andar, desci ao largo.
Depois, tomei os caminhos que havia
e mais outros que depois desses eu sabia.
E tanto já me afastei dos caminhos que fizeram,
que de vós todos perdido
vou descobrindo esses outros caminhos que só eu sei.
Veio a Guarda com a lei no cano das carabinas.
Cercaram-me num "montado";
puseram joelho em terra;
gritaram que me rendesse
à lei dos caminhos feitos.
Mas eu olhei-os de longe, / tão distante e tão de longe,
o rosto apenas virado, / que só vi em meu redor
dez pobres ajoelhados / perante mim, seu senhor.
Gente chegou às janelas, / saíram homens à rua:
- as mães chamaram os filhos, / bateram portas fechadas!
E eu, o desconhecido, o vagabundo rasgado,
entrei no largo da vila entre dez guardas armados;
mais temido e mais amado que o deus a que todos rezam.
(...) E vendo que eu lhes fugia / assim de altiva maneira à sua lei decorada,
lá, longe do sol e da vida, / no fundo duma cadeia,
cheios de raiva me bateram.
Inanimado, / tombei por fim a um canto.
E enquanto eles redobravam / sobre o meu corpo tombado,
adormecido
eu descansava / de tão longa caminhada!...
Manuel da Fonseca
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