A ESTÓRIA DA VIDA E MORTE DO ZÉ DO NACO
-Raios parta a vida... Um homem não ganha para si, como há-de arranjar família? - Prègava com seus botões o Zé do Naco. Ele sabia de muitos que viravam costas à terra e, em pouco tempo, vinham notícias de que tinham melhorado a vida.
- Porque não hei-de eu fazer o mesmo? - indagava. E se bem pensou, melhor o fez.
Saco às costas e sem rumo, foi andando e pedindo trabalho.
Correu aldeias, vilas e cidades. Só promessas...
Já na Beira - Baixa, cansado, desanimado, entrou numa taberna:
- Não sabem de alguém que me dê cómodo? Mesmo num palheiro. Preciso de descansar e, depois trabalhar.
- Olhe, o Sr. Januário tem lá palheiros no Monte e precisa mandar os porcos pró montado - respondeu um sujeito de barrete e cinta larga, ao mesmo tempo que enrolava o tabaco numa mortalha.
Beberam um copito e lá foram ambos a casa do lavrador.
Nessa noite Zé do Naco descansou, contente por ter arranjado trabalho certo com cama e mesa por conta do patrão. O resto logo se veria.
Quexê, quexê, quexê - sibilava o nosso guardador de porcos, intervalando o assobio, de varapau às costas.
Falava aos animais e começou a a perceber que estes o entendiam. Era já quase uma família de que Zé do Naco era o chefe.
Sentia-se quase realizado. Ainda mais quando a mulher do patrão lhe mandou pela criada roupa usada do Sr. Januário.
Maria insistiu para que ele trocasse a farpela, ali mesmo. Ele, que não. Queria guardá-la pró domingo.
- Ó sr. Zéi é pra ver se lhe fica bem....
Zé do Naco fez-lhe a vontade. Puxou do espelho redondo que trazia sempre no bolso do colete velho, mirou-se e, vaidoso, de andar ondeante, desfilou para a sua colega. Esta olhou-o das botas ao chapéu. Corou, envergonhada. Achou-o bonito e a roupa assentava-lhe melhor do que ao patrão.
Daí em diante, nada mais faltou ao Zé: O melhor chouriço. O toucinho mais alto e branquinho, o pão da primeira cozedura que, às escondidas, Maria recheava com enchidos..
Ela, bem mais pequena que ele, de olhinhos meio fechados, sorridente, redondinha, metia cobiça ao Zé do Naco.
Um dia, à tardinha, véspera duma noite que se adivinhava fria, Maria partiu ao encontro do colega, levando-lhe um cobertor de papa.
- Está um dia de rachar, Sr. Zéi!...
Ele aceitou a manta e num gesto largo envolveu a Maria. Apertados, beijaram-se e caíram ambos na relva macia. Os porcos, sem comando, tresmalharam-se. E foi já noite alta que o moiral deu pela tarefa que ainda o esperava, enquanto Maria lhe cantava:
Aqui tens meu coração
e a chave pró abrir
não tenho mais que te dar
nem tens mais que me pedir.
Continua no domingo
Sem comentários:
Enviar um comentário