O SALTO
Na década de 60 a vida era insuportável: ganhava-se mal e o trabalho duro.
Decidi emigrar clandestinamente pois não era possível de outra forma. Mas como não tinha dinheiro e os passadores levavam 30 contos, resolvi pedi-los emprestados a juro, com dois fiadores.
Negociei com um passador da Barreira Alva a quem entreguei metade de uma fotografia ( a outra metade entregaria em Paris, final da viagem).
Tudo acertado, apresentei-me na estação da CP no Entroncamento. Nas minhas condições estavam mais trinta pessoas que depressa se distribuíram pelas várias carruagens para não haver suspeita.
Chegámos a Penamacor e nos arredores fomos escondidos numa azenha até ao anoitecer. Atravessámos o rio e, já na Espanha, palmilhamos dezenas de quilómetros até nos encontrar-mos com outro grupo de cerca de 100 homens e mulheres num frondoso pinhal onde passámos o dia escondidos, com muita chuva e muito frio. À noite chegou um grande camião de transporte de animais onde todos embarcamos, muito apertados, em pé, encostados uns aos outros. As necessidades eram feitas numa barrica onde era difícil chegar. E assim atravessámos toda a Espanha, molhados, com frio, fome e alguns sustos. Como já era manhã, fomos escondidos dentro de palhotas e ali forneceram-nos latas de atum, pão e vinho. À noite, outra caminhada de muitos quilómetros, até à fronteira de França, atravessando um rio com a ajuda de troncos de árvores. Mais outra grande caminhada feriu pernas e pés até chegar-mos a uma estação de caminho de ferro. Partimos, separados nas várias carruagens, até Paris onde entreguei a outra metade da minha fotografia. Segui até Champinhi onde me aguardavam três conterrâneos: Prudêncio, Joaquim da Justina e Constantino da Ministra.
Era o fim do martírio de três longos dias e noites de sofrimento, fome, frio, cansaço, medo e angústia, sentimentos que não sei descrever.
Vitor Loureiro
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